Recentemente vi uma entrevista com um ícone do wrestling. Sim, wrestling, aquela modalidade que é um misto de desporto e entretenimento, de verdade e mentira, trabalho e paixão. Mark Calaway é um veterano desta indústria, e a sua personagem, The Undertaker, é uma das mais lendárias. Calaway não costuma dar muitas entrevistas, principalmente porque isso não condiz muito com a personagem que encarna, pouco faladora e com uma aura sobrenatural. Além do interesse óbvio para os seus fãs e os da modalidade, algumas das coisas que ele disse são lições bastante oportunas para todos no mundo dos negócios.
Menos é mais. O que Calaway constata agora é que, em virtude da elevada concorrência, a maioria dos wrestlers acaba por tentar fazer mais, mostrar mais e falar mais alto para se destacar. Todos acabam, assim, por se assemelhar. Na realidade, é o que se assiste em vários mercados e indústrias, com o elevado número de produtos, marcas e ofertas comerciais. Mais características, mais funcionalidades, mais benefícios, mais campanhas, mais promoções, etc. Porque não focar apenas em algo concreto que possa realmente ter significado e criar impacto?
O mais importante são as emoções. Para o espetador pouco habituado não fará sentido. O wrestling são os golpes, as acrobacias, as manobras. Mas para quem lá anda e percebe como funciona, sabe que isso é só a ponta do iceberg. Calaway, que agora trabalha mais com jovens talentos, vê muitos deles, altamente atléticos e fisicamente dotados, a tentar fazer cada vez mais golpes e com maior grau de dificuldade. Para ele isto só traz uma consequência: mais risco de lesões. E como cada vez os incrementos são mais marginais, o público vai acabar por se fartar de ver sempre o mesmo. O que antes era “uau” agora é “zzz”. A diferença, por isso, está nas emoções que os wrestlers conseguem produzir no público e não na quantidade de golpes (claro que os golpes são necessários para ajudar a gerar as emoções, mas são o meio, não o fim). E não se passa o mesmo com os produtos, cujos golpes são as funcionalidades? Quantos não acabam esquecidos ou definham porque se tornam indiferentes aos olhos dos consumidores? Quantos não são trocados pelas novidades que aparecem? Porque estão apenas focados no visível (as funcionalidades, a forma, a embalagem) e não no invisível (as emoções, o envolvimento, o valor).
Manter a relevância. Segundo Calaway, o principal objetivo de um wrestler deveria ser manter-se relevante para o público. Não é ser o mais forte, não é ter mais títulos, nem é ser o melhor, é manter-se relevante. E o grande desafio é como manter a relevância ao mesmo tempo que se é verdadeiro consigo próprio e com a personagem que se encarna. É um equilíbrio difícil. Por isso, não há uma fórmula que funcione para todos. O que pode funcionar para um pode não fazer sentido para outro. E o público percebe rapidamente quando não faz sentido. Com os produtos passa-se o mesmo: há que pôr o consumidor em primeiro e perceber o que é útil e que tem valor para ele. Mas isso tem de encaixar com a história do produto, a identidade da marca e o posicionamento da empresa. Senão vai soar a falso. E o que é falso não tem futuro.
No mundo do wrestling a cola que une todos estes aspetos tem um nome: narrativa. As histórias que são contadas e a forma como são contadas permitem focar no essencial, gerar emoções e manter o interesse. Não será semelhante no universo dos produtos, marcas e empresas?
Durante os programas de wrestling costuma aparecer sempre a seguinte mensagem: “Não tentem isto em casa ou na escola!”. Após as lições de Calaway, creio que é seguro afirmar “Tentem isto na empresa!”